Kinsey - Vamos Falar de Sexo (2004)

17/11/2016

Kinsey

Drama ‧ Romance ‧ Biografia ‧ 1h 58m ‧ 2004 ‧ Bill Condon


O filme começa com uma cena em branco e preto. Logo, nos são despejadas interessantes noções sobre a arte de se fazer uma boa entrevista, além do tema central do filme: o sexo. Trata-se de um teste para potenciais pesquisadores, organizado por Alfred Kinsey, submetido a perguntas chocantes sobre a própria intimidade. Uma dessas nos imerge nas lembranças de seu passado.

Ao longo do flashback percebemos como vários elementos contribuíram para castrar psicologicamente o jovem Kinsey. Dentro da igreja metodista, o rigor das normas e o dogmatismo faziam com que ele e os demais adeptos se sentissem culpados pelas próprias pulsões carnais. Entre as paredes de casa, a figura paterna o perseguia com seu conservadorismo rigoroso. A imposição das escolhas do pai aniquilava o livre arbítrio do filho, que só conseguia sentir-se bem em meio à natureza. Essa paixão pelas atividades ao ar livre, tanto platônica quanto secreta, o levará a seguir estudos zoológicos, contra a vontade do pai que queria um primogênito engenheiro, quase um reflexo daquela racionalidade estrema que nunca foi apropriada ao espírito livre do protagonista.

Graduando-se em biologia e em psicologia, Kinsey conclui seus estudos em Harvard, aproximando-se da entomologia. Em seguida, ensina essa matéria no departamento de zoologia da Universidade Bloomington de Indiana. Lá, conhece sua futura esposa Clara Bracken McMillen, uma aluna com a qual entra em sintonia não somente pela paixão comum pela disciplina, mas também pelo fato dos dois compartilharem a dor da repressão sexual: ambos são virgens e vivenciam a alienação dos próprios impulsos carnais.

Professor e aluna, após algumas incertezas, se casam e criam uma família. Todavia, é nesse intervalo de tempo que ocorrem os fatos mais interessantes. Durante a noite de núpcias, o casal não consegue ter uma relação sexual. Será esse problema a fazer com que Kinsey tenha uma revelação: o médico que se ocupa do problema íntimo recém surgido, além de solucioná-lo com uma simples cirurgia, faz perceber o quão pouco se sabe sobre o assunto.

O protagonista resolve então aplicar o rigor científico de sua pesquisa sobre as vespas, tema pouco empolgante, ao assunto tabu de sua sociedade. Define-se a figura do Doutor Sexo.

Há inicio a grande epopéia que levará à criação dos dois livros mais importantes da sexologia: "O comportamento sexual do homem", em 1948, e "O comportamento sexual da mulher", em 1953.

A partir desse momento, a linearidade dos fatos toma conta da película, tornando-a previsível: ao longo da pesquisa, Kinsey deverá superar os obstáculos representados por uma sociedade intolerante e por uma família prestes a se despedaçar diante da face perversa de seu objeto de estudo.

Torna-se claro, portanto, que ao diretor pouco importa dos efeitos dessa investigação chocante na sociedade americana, pois o foco do filme é a vivência de um homem, cujos gestos são seqüelas de uma educação repressiva. Comprovações empíricas e dedicação acadêmica deixam espaço aos verdadeiros motivadores da "Revolução sexual": inconveniente pessoal e traumas familiares. Para Bill Condon, cada pensamento ou escolha é determinado pelas feridas que nos foram feitas no passado.

Nessa ótica, não há como julgar negativamente o protagonista do filme quando decide de se tornar ele mesmo uma cobaia para seus testes sexuais. Como Clara, o publico é obrigado a aceitar a traição de Kinsey em nome da ciência. De fato, uma vez que a pulsão sexual é vista como parte integrante da psicologia humana, a monogamia torna-se a enésima imposição repressiva da sociedade.

No determinismo biológico, não há espaço para sentimentos como o amor e a fidelidade.

Percebemos a falibilidade desse discurso na última cena do filme. Estamos em uma floresta e Kinsey, afastando-se de sua esposa, acaba se perdendo. Por alguns segundos, a natureza que tanto o confortava agora o assusta. Sente-se bem somente ao reencontrar Clara. Eis uma questão que suas pesquisas nunca poderão explicar: a necessidade do ser humano de amar e de ser amado.

                                                                                                   Dino Lucas Galeazzi

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